12H2O + 6CO2 → 6O2 + 6H2O + C6H12O6


De óculos escuros. Mesmo ali, no trem. Pela janela, o túnel. Flashes verde neon. Códigos de letras e números. Ilegíveis, por decifrar. E porque a mulher não tem cabresto, desvia o olhar. À sua frente, no banco oposto. Um homem. Bonito. Pensamento que lhe escapa. De olhos pequenos e escuros. Outro túnel. Ela não percebe. Mas ele, sim. Para além do olhar, o sorrir. Dela. Pequeno, sem saber de si. Só lábios e intenção. Sim. Ela gosta. Daquela beleza humilde. Sem ostentar nem ofender. Sim. Mas... o homem está de chinelo. Assim como a mulher. Aquela outra, ao lado dele. A mulher de óculos então inventa. Um casal. Uma história. Um homem bonito de pés acalorados. Um casal em viagem. Calados e sérios. Tanto cansaço. Tempo demais. Tanto costume. Da voz, do jeito e dos gostos. Do sabor do suor e da saliva. A história também em flash. Passa. Veloz. Logo chega. Estação terminal. Todos descem. O casal de chinelos, a mulher de óculos. Ela não olha mais para ele. Passou, já esqueceu. Não. Antes. Ele surge ao lado dela.

E sorri. Sorri. Sorri. E...

Não.

Não pode ser assim.

Metrô. Chinelo. Mulher de óculos imaginando histórias. Sorriso de amor à primeira vista. Romancezinho edulcorado, enjoativo. Meg Ryan e Tom Hanks na reprise da sessão da tarde. Ela, de cabelo pantera e ombreiras. Vergonha da moda da década de 80. Ele, o eterno cara legal. Assexuado, meio vegetal. Vamos fazer fotossíntese no mesmo vaso na minúscula
varanda do meu apartamento financiado de classe média?  

Não.

Tanto cansaço. Deve ser. Fecho o pequeno caderno. De capa dura. Vermelha. Aquele. Do qual ameaça escorrer sangue. Das facadas e dos tiros. Tantos. Muitas as testemunhas e réus e promotores e juízas loiras. Eu e essas juízas loiras. Sem burrice ou inteligência de planta. Mesmo assim. Há sessões em que o elenco todo parece almejar só a fotossíntese. Um pouco de sol. Fora dali. Das plenárias sem janelas. Do Fórum de rampas largas e vidros escuros. Um banho de sol. O bolor da pele secando. Todos um pouco mais vivos. Esquecendo o sangue e as vítimas. Só um pouco. Um respiro, côté vegetal. Menos de simbiose e comensalismo, mais de competição e parasitismo. Às vezes mesmo, côté predatório, canibal.

Comentários

  1. escrever como se ouve música. ver o que não está lá - que só pode existir porque passa por você. é ouvir a harmonia, relação dos sons, que não existe como coisa em si - só dentro de quem sabe entende-la.

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  2. I hardly write remarκs, but і did a feω searching and wοund up herе "12H2O + 6CO2 → 6O2 + 6H2O + C6H12O6".
    And I асtually do have 2 quеѕtions
    fοг you if you ԁo nοt mіnd.
    Is іt just mе or ԁoes it lοok lіκе a few of theѕе
    resρonses аppear likе they are left by bгаіn dead
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