Minotauro na arena - Jardim das delícias, coluna site Revista da Cultura
O texto atende ao pedido de um casal de amigos queridos. Atentei para que houvesse sensibilidade e respeito, verdade e empatia. Mas tal cuidado revela muito também. De uma imunidade sabida impossível em relação aos preconceitos e estereótipos que envolvem o desejo e o afeto entre pessoas do mesmo gênero. Ainda assim, aqui, o texto.
Díspares sugestões de trilhas:
Manuel de Falla e seu “El amor brujo” e “Temptation”, do Moby:
“Tonight I think I walk alone to
find my soul as I go home.
Oh, it’s the last time, it’s the
last time.”
O homem na arena. Sem esperar por
outro touro, mas por novilhos de carne macia. Na idade de quem pode e quer tudo
da vida. Uma potência. Outra, igualmente bem-vinda. E então em meio ao suor, as
carnes misturadas. No olhar do vitelo, uma mistura de surpresa e descoberta. Diante
do touro, que sabe muito, tanto. Procurar, fazer, dar. Prazer, sensações. Em
meio ao perigo. Algum. Pouco.
Não.
O jovem tem seu próprio pai. Pai
após vários anos do casamento com a mãe. De fazerem outras duas filhas. Pai que
hoje passa pelo filho sem perguntar. Dos outros homens. Do sexo. Pai que hoje passa
pelo filho sem fingir que não sabe. Pai que apenas cala. Um jeito disso tudo
existir menos. Isso que não acha safadeza. Cala, mas no fundo, crê em defeito.
E se podia ser de fabricação, era então dele, pai.
Após algumas semanas.
O jovem desaparece. Após cinema e
outras baladas, praia e presentes. O celular desligado. Às vezes. Muitas. De
súbito, tão ocupado. Em fuga. Do afeto. Daquele homem e de seu abraço, ameaça
de fagocitose. Devoração de relacionamento sério, de compromisso e cobrança. Prisão
sem crime nem cadáver que não o da vida que escapava.
Não.
O homem na arena. De volta. Ainda
sem esperar touros, no gosto por novilhos. Ainda que à beira de um motim. Contra
si. Contra o que de si, criava desejo, desencontro e solidão. Dor. A arena
vasta. Demais. Por ser manchada de sangue. Não. Ainda não.
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