Histórias terceirizadas 1
História terceirizada. Decantada pelo tempo. Impressa na memória do
PM. Um dia. Longe. Testemunhou sem poder esquecer mais. Num outro dia. Depois. Contou,
narrou. Sem saber se era possível. Dar conta. A perturbação. A tristeza que
sobrou nele. A tristeza que vazava da mãe. Calada durante seu julgamento. Tão
cansada. De sua culpa. De não conseguir explicar. De não saber. Mesmo que
insistissem. Polícia, delegado, médico, psiquiatra, juiz, promotor, defensor. Repetindo perguntas. As mesmas e outras diferentes. A cabeça vazia de ideias. Como
o ventre, ali mesmo no banheiro de casa. Não entendeu também. Burra. Aquele monte
de carne e sangue. Que estranho. O que era isso agora. Não sabia. Achou melhor
guardar. Depois ia ver. Não agora. E enrolou o bebê em uns panos. Depois ia
perguntar para alguém. Aí iria entender. É. Sempre tem alguém que sabe das
coisas. Mais do que ela. É. Depois. Dias. O corpo do bebê no armário da
cozinha. Ela ainda sem saber. Como. Como tudo podia ser assim. Tão errado. As
ideias da sua cabeça. Mas não. Que ideias. O bebê junto com o arroz e o açúcar.
Com fome dela. Ela, sem ouvidos para ele. Por dias. Aí ele cansou também. E ficou
quietinho. Como que esperando. Mas não. Aí veio o cheiro. O fedor da carne. Um
pouco podre. Empesteando a casa toda. Nesse dia. Ela abre o armário e só aí é
que se dá conta. Não. Não dá conta. De si. Do que fez. E chora. E treme. Só começo.
Sem fim.
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