Histórias Terceirizadas 2
Dois empréstimos.
Para este, de um colega. Para pagar sem emprego, cata latinhas.
Vasculha latas de lixo. Lanchonetes, bares, lixeiras quebradas penduradas nos
postes. Bom mesmo é fim de festa. Difícil. E tem ainda a concorrência. Outros velhos
e mulheres. Antes tinha vergonha. Agora pode dizer que está ajudando o planeta.
Hum. O seu pequeno mundo tinha que vir antes. Respirar e sobreviver. Alguma
dignidade de banhos e roupas. Difícil também. Mas se é tão pouco. Isto, do que
precisa. Mais do que gostaria. Seria bom fazer como as plantas. Respirar o sol
e o tempo. Beber chuva. Ficar ao relento sem pegar gripe nem pulgas. Uma noite.
Já pouca, quase dia. Na lixeira de um prédio. Teve festa. De criança. Além de garrafas e latinhas,
salgadinhos com chantilly. O bolo amassado. Clarinho, com morangos. Tinha
também outros sacos. Um era preto e pesado. Ele abre. Tanta carne. Crua. Aos
pedaços. Grandes e pequenos. Partes de membros. Ossos aparentes, brancos. Tanto sangue. Uma cabeça de cabelos longos e boca aberta. Meu Deus.
O empréstimo do outro.
Por algumas horas. Sem pagamento. Usou e devolveu para o vizinho. Antes, lavou bem. Sem lembrar de conferir. O serrote e seus dentes. Se gastos de ossos e carnes. Apesar de magro, o travesti deu trabalho. Faltava hábito. No desespero, ficou do jeito que deu. Exaustos, ele e o amigo acabaram se achando espertos. Ninguém ia saber. Estava tudo certo. Desceram o saco. Jogaram na lixeira do prédio. O caminhão passa daqui a pouco. Podiam então dormir. Tanto sono. Ainda a ressaca de bebida e pedras. Da festinha a três. Bem doidos, fumaram, beberam e treparam. Até que acabou. Primeiro as pedras. Depois a medida e o juízo. O travesti na falta. Sem batom. Sem parar de falar. A doideira acabando. Só nóia. Todo aquele monte de palavras que saía da boca do cara sem parar. Martelando na cabeça. Cala a boca. Caralho. Cala essa boca. Ele não calou. Doido. Sem noção. Cala a boca, porra, que merda do caralho. Calaram por ele. Putz. Que merda. E agora. Caralho. Não tinham serrote. Podiam pedir emprestado. Pode deixar. Iam devolver logo. Já, já.
Por algumas horas. Sem pagamento. Usou e devolveu para o vizinho. Antes, lavou bem. Sem lembrar de conferir. O serrote e seus dentes. Se gastos de ossos e carnes. Apesar de magro, o travesti deu trabalho. Faltava hábito. No desespero, ficou do jeito que deu. Exaustos, ele e o amigo acabaram se achando espertos. Ninguém ia saber. Estava tudo certo. Desceram o saco. Jogaram na lixeira do prédio. O caminhão passa daqui a pouco. Podiam então dormir. Tanto sono. Ainda a ressaca de bebida e pedras. Da festinha a três. Bem doidos, fumaram, beberam e treparam. Até que acabou. Primeiro as pedras. Depois a medida e o juízo. O travesti na falta. Sem batom. Sem parar de falar. A doideira acabando. Só nóia. Todo aquele monte de palavras que saía da boca do cara sem parar. Martelando na cabeça. Cala a boca. Caralho. Cala essa boca. Ele não calou. Doido. Sem noção. Cala a boca, porra, que merda do caralho. Calaram por ele. Putz. Que merda. E agora. Caralho. Não tinham serrote. Podiam pedir emprestado. Pode deixar. Iam devolver logo. Já, já.
Incrível. A gente pensa que eh só ficção. O ser humano parece uma mentira. Fico pensando de que forma essa experiência literária vai mudando a mente, as crenças, os valores desta escritora, Eda Nagayama.
ResponderExcluirÉ muito forte... O livro surgiu desse impacto - uma incompreensão e atordoamento a partir de uma história do homicídio de uma menina de 3 anos. Como era possível? E desta maneira? E isso era ainda humano.
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